O Tremor Essencial caracteriza-se por um tremor de ação ou postural, ou seja ocorre durante o movimento mas também pode ocorrer durante uma postura mantida, quando a pessoa está segurando objetos. O tremor essencial é geralmente bilateral, predominante em mãos e braços, agravado durante movimentos voluntários das mãos, como escrever ou segurar objetos. Esse tremor se agrava também com o nervosismo ou ansiedade. O tremor é o sintoma predominante no Tremor essencial como o próprio nome da doença diz. Na evolução a longo prazo, o tremor essencial tende a agravar-se, assumindo um caráter progressivo, sem afetar significativamente outras funções neurológicas, embora possa intensificar-se com a idade. E geral responde bem a medicações, mas pode ser refratário a elas, o que deixa a pessoa com dificuldade significativas em atividades de vida diária. Essa doença não possui cura na atualidade e os tratamentos trabalham para aliviar os sintomas.
Outra doença que os pacientes também apresenta tremor é a doença de Parkinson. No entanto, o tremor parkinsoniano é classicamente um tremor de repouso, ou seja, ocorre quando a pessoa está com os braços ou mãos parados. O tremor, assim como os outro sintomas na doença de Parkinson, é tipicamente unilateral no início da doença e com o passar do tempo e o agravo da doença torna-se bilateral. Mas o tremor não é em geral o sintoma predominante na doença de Parkinson sendo que cerca de 1/3 dos pacientes não apresentam tremor. Em menos de 10 % dos casos é que o tremor pode significar o sintoma mais importante trazendo maior dificuldade funcional. Mas na maior parte do tempo a maior dificuldade desses pacientes é relacionada a outros sinais motores, como bradicinesia, rigidez e dificuldade em locomoção. Ou seja, o tremor na doença de Parkinson é parte de uma síndrome neurodegenerativa complexa e tende a progredir com diversos sintomas motores e assim como diversos sintomas não motores. Frequentemente o tremor não é um sintoma debilitante na doença de Parkinson a não ser em casos em que o tremor seja o sintoma predominante. Essa doença não possui cura na atualidade e os tratamentos trabalham para aliviar os sintomas.
Quanto ao tratamento, o tremor refratário a medicações pode ser tratado com em ambas as doenças com terapias intervencionistas nos casos refratários. O HIFU (do Inglês HIFU High-Intensity Focused Ultrasound ou Ultrassom Focalizado de Alta Intensidade) tem mostrado excelente resposta no tremor essencial unilateral, com rápida melhora clínica, embora sua eficácia possa diminuir levemente ao longo dos anos. No Parkinson, o HIFU é eficaz especificamente contra o tremor, mas não atua nos demais sintomas da doença. Já a estimulação cerebral profunda (DBS) apresenta maior versatilidade, sendo eficaz não só para o tremor parkinsoniano, mas também para rigidez e bradicinesia, permitindo controle bilateral e ajuste pós-operatório, o que a torna mais interessante em pacientes com Parkinson.
O HIFU (High-Intensity Focused Ultrasound) é uma técnica minimamente invasiva, guiada por ressonância magnética (MRgFUS), aprovada para o tratamento de tremores refratários, principalmente o tremor essencial e, em casos selecionados, o tremor da Doença de Parkinson conforme explanado acima.
Princípios da Técnica
O HIFU utiliza feixes convergentes de ultrassom de alta energia para induzir termo-coagulação precisa em alvos profundos do cérebro, sem a necessidade de incisão cirúrgica ou implante de eletrodos. O alvo mais comumente tratado é o núcleo ventral intermédio do tálamo (Vim), componente crítico do circuito tálamo cortical envolvido no circuito cerebral e consequentemente participa na gênese do tremor.
Indicações Clínicas
Tremor essencial refratário ao tratamento farmacológico. Tremor parkinsoniano predominante, especialmente quando há contraindicação ou recusa de técnicas invasivas como a DBS
Pacientes com alto risco cirúrgico ou que preferem uma alternativa sem necessidade de incisão cirúrgica, pois a lesão (termoablação) causada pelo ultrassom não é reversível.
Seleção do Paciente
Critérios fundamentais incluem:
Diagnóstico confirmado por neurologista especialista em distúrbio do movimento.
Ausência de contraindicações anatômicas, ou seja osso do crânio muito espesso ou craniotomias prévias ou presença de eletrodos ou implantes cerebrais.
Avaliação do índice de densidade óssea craniana (skull density ratio, SDR), geralmente mínimo de 0,40–0,45 para eficácia térmica adequada, se não não é possível a realização do procedimento.
Ausência de distúrbios psiquiátricos ou cognitivos severos
Etapas da Técnica
- Planejamento por imagem (RM e TC do crânio): identificação precisa do alvo talâmico (Vim) e cálculo das trajetórias acústicas.
- Corte de cabelo (máquina zero): É necessário raspar todo o cabelo para evitar que bolhas presentes no cabelo atrapalhe o procedimento
- Fixação do halo craniano com o paciente acordado sob anestesia local e colocação da membrana se silicone para evitar vazamento da água fria e degaseificada que circula para esfriar o couro cabeludo durante o procedimento de termo-lesão, necessário para o acoplamento acústico e controle térmico.
- Aplicação progressiva de feixes de ultrassom com o paciente acordado dentro do túnel da ressonância: com incrementos de energia sob monitoramento contínuo por RM térmica.
- Avaliação intraoperatória em tempo real: exame neurológico e testes funcionais após sonicações subablativas facilitam ajuste da localização antes da lesão definitiva.
- Lesão definitiva (termo-coagulação): geralmente com temperatura entre 54–60 °C por 10–20 segundos.
- Todo o procedimento ocorrer entre 2 a 4 horas a depender de cada paciente
Vantagens
Sem necessidade de abertura do crânio ou anestesia geral
Procedimento ambulatorial
Rápido início do efeito clínico sobre o tremor
Boa taxa de controle do tremor unilateral (melhora funcional entre 60–70%)
Limitações e Efeitos Adversos
Tratamento atualmente é aprovado apenas para tremor unilateral (geralmente do lado dominante)
Efeitos adversos incluem:
- Parestesias (Formigamento na boca ou lábios ou nos braçoes e pernas) transitórias
- Ataxia (incoordenação para canihar ou segurar objetos) em geral é leve e não compromete funções.
- Distúrbios da marcha
- Distúrbios de fala, em casos de lesão imprecisa
- A ausência de reversibilidade (diferente da DBS) é um ponto crítico: uma vez realizada a termolesão, os efeitos são permanentes.
Evidência Clínica
Diversos estudos já mostraram beneficio no tratamento do tremor assim como estudos randomizados, como o publicado no New England Journal of Medicine (Elias et al., 2016), demonstraram significativa redução do escore de tremor (CRST) com melhora funcional sustentada por até 3 anos em muitos pacientes. A técnica também está sendo avaliada para outras indicações, incluindo distonia e TOC, com resultados ainda experimentais.
Conclusão
O HIFU representa uma inovação importante no arsenal terapêutico dos distúrbios do movimento, principalmente o tremor, combinando alta precisão, baixa invasividade e recuperação rápida, especialmente benéfico para pacientes com tremor unilateral refratário. Não significa a cura da doença, ou seja nem a doença de Parkinson e nem o tremor essencial são curados por essa técnica. A seleção criteriosa do paciente, domínio do conhecimento neuro-anatômico cerebral e experiência da equipe com esse e outros procedimentos são determinantes para a segurança e eficácia do procedimento, como toda a técnica que é aplicada no cérebro, sendo considerada cirúrgica ou não.
Fontes:
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